Ha ha hi hi!




Vou confessar: tem tanta coisa acontecendo ao mesmo tempo que eu ando meio perdido. Preciso organizar os manuscritos e postar (se a preguiça deixar). Mas enquanto não organizo, fica os vídeos da minha família, para provar que eu sou o King Size de Sorocaba!

Beijos, meus súditos.

Alexandre dos Santos Lima - King Size do Rio de Janeiro


Fábia dos Santos Lima - Esposa do King Size do Rio de Janeiro


Kezia dos Santos Lima - Filha do King Size do Rio de Janeiro


Zina do Pânico dos Santos Lima - Filho bastardo do King Size do Rio de Janeiro


Antonio Carlos Ferreira de Sena - Pai do King Size do Rio de Janeiro


Adriano, tá me ouvindo? dos Santos Lima - Esposo do Pai do King Size do Rio de Janeiro


Fernando César Oliveira de Carvalho - Primo do tio, do concunhado, do afilhado do primo de terceiro degrau do King Size do Rio de Janeiro; que comprova a descendência direta e o direito de ser o King Size de Sorocaba.

Veja o vídeo no Vimeo, clicando aqui.

E de bônus, o maravi-lindo vídeo, Jesus 2000.

Conto-Desafio para o blog http://desafiodoscontos.blogspot.com (Tá pronto faz um tempão, eu que não tinha mandado...)

O LIVRO

Capítulo I

A velha biblioteca exalava um odor de couro, papiros, papéis velhos e amarelados, além da grande quantidade de poeira que os visitantes achavam que poderiam preencher os velhos mares. Qualquer pessoa alérgica que ali adentrava, passava semanas espirrando por sentir aquele odor, mas para os amantes do conhecimento era como se tivesse encontrado o amor de sua vida ao ver a extensa coleção de livros, crônicas, poesias e documentos atuais e do Velho Mundo que se amontoavam e pareciam disputar o espaço das imensas estantes que pareciam se estender ao infinito. Todos que adentravam a sala de estudos sentiam-se impelidos em olhar para cima, e eram tocados por um êxtase de fruição diante do teto abobadado, e seu imenso vitral que parecia muito mais vivo quando era iluminado pela luz prateada do luar. Via-se no vitral, uma furiosa batalha entre um grifo e um dragão vermelho, ambos montarias de cavaleiros com armaduras reluzentes, mas com tamanho detalhamento que se tinha a impressão que as figuras ali representadas iriam se mover a qualquer momento. A sala arredondada em formato de torre era somente uma das partes da imensa biblioteca, mas ali era o espaço onde eram colocados os livros que poderiam ser analisados e estudados. As outras partes da biblioteca eram restritas aos clérigos do deus do conhecimento, e onde eram guardadas as cópias originais dos livros, documentos mais importantes e todo e qualquer material que não poderia ser manuseado por qualquer um que não tivesse autorização do grão-mestre dos clérigos.

Sentado solitariamente em uma velha mesa de carvalho, e rodeado de imensas pilhas de livros, um shair gnomo as revirava ansiosamente quando parou subitamente por sentir uma presença estranha naquela sala e que levou seus olhos imediatamente em direção à porta. Um vulto familiar jazia encostado no batente da porta. Ah, você! – exclamou rapidamente, enquanto revirava os velhos livros como se procurasse algum em especial.

– Sente-se que eu vou contar-lhe a história como ela aconteceu... Mesmoqueeunãoestivesseporláseiqueéverdadeporcontadeumbardoviajantequemecontou. (mesmo eu não estando lá). Oh, sim! Aqui está, velho amigo. Não, não diga nada. Basta sentar e ouvir.

O gnomo tomou em suas mãos um velho livro surrado, com capa de couro vermelha. As letras do idioma élfico da capa adornada brilhavam em um tom dourado pálido refletindo a luz das velas, onde estava escrito “A ojgumoi liüj tadliüj a maliarlieü liü Lqüüjingm lideniliü tani nipmoli lii dolii” (A história dos pecados e da redenção do Ljosaltr maculado pela lágrima da vida), que logo foram apagadas pelo sopro que espalhou a poeira das velhas páginas pelo ambiente. Abrindo o livro ao meio, o shair iniciou sua procura desajeitada por alguma página em específico, que ao encontrar exibiu uma expressão de satisfação, abrindo a boca e levantando o dedo, parecendo que ia dizer algo, logo desistindo ao ver a expressão de impaciência de seu misterioso visitante. Voltando seus olhos à página, sussurrando com um tom de voz solene como se lesse algum texto sagrado, percorrendo as letras manuscritas com o dedo indicador, pausando ao virar da página e mostrando uma rica ilustração para seu companheiro de leitura.

– Veja! Este é o elfo. Apesar da ilustração não estar perfeitamente como ele é, ela transmite o espírito forte deste clérigo.

Ao perceber que não chamou muita atenção com a imagem que acabara de mostrar deixou cair os ombros resignado, e voltou à sua leitura, aumentando seu tom de voz, em uma tentativa de captar a atenção de seu interpelador.

... A parca luz alaranjada das tochas e da lareira ilumina o ambiente, enquanto diversas silhuetas se movimentam ritmadas com o som do alaúde de um bardo desconhecido naquelas paragens, mas que cativou rapidamente seu público, que dançavam quase como sombras, indistinguíveis da penumbra que banha o ambiente. A taverna está incomumente cheia, devido às festividades de comemoração do bicentenário da batalha contra uma horda de homens do oeste que havia destruído aquele vilarejo, uma festa obrigatória, mas de poucas alegrias, pois somente através de um imenso esforço conjunto, unindo ainda mais as pessoas daquela pequena comunidade que se formara em uma das trilhas de mercadores que passavam pelo grande deserto que se iniciava na fronteira, transformando-a hoje, nesta opulenta cidade. A riqueza trazida pela extração mineral que atraiu os primeiros moradores foi justamente o motivo da disputa que dividiu a cidade, ainda em formação, em partidários de duas famílias poderosas até os dias de hoje: os Malhaferro, uma família de anões da planície, grandes forjadores e poderosos guerreiros, que acreditam na herança racial daquelas terras; e os Malford, a primeira família humana a pisar naquela região e que era conhecida em toda a extensão do mundo por seu senso de justiça e códigos familiares rígidos, e também por formar os mais fervorosos paladinos de toda terra civilizada. Contudo, o fragmento da família que ali se instalou era justamente uma mancha no brasão da família, devido seu senso distorcido e suas motivações mesquinhas. Mas além de seus bens materiais acumulados ao longo dos anos, esta família atualmente contava com um trunfo: Nathan. Este jovem rapaz, que no alto de seus dezoito anos, já demonstrava em sua face precocemente barbada e marcada uma vida difícil e de imensa dedicação ao seu deus, fora o único da família que se desviou dos caminhos planejados por seus pais e tornou-se um clérigo. De certa forma, servia como um diplomata entre as duas partes da família, sendo admirado por ambos os lados por sua conduta honrada. Neste dia, Nathan estava em um canto escuro da taverna da cidade, destituído de sua brilhante armadura, trajando apenas seu robe para não atrair atenção indesejada, observando toda aquela movimentação dos simpatizantes e descendentes de cada família ocupando lados distintos do salão. Decidiu pedir uma caneca da famosa cerveja, somente com o intuito de pagar por sua estadia naquela mesa. Aquele lugar não era como as tavernas de luxo dos grandes centros, mas seu grande espaço era utilizado todo ano como um salão comunitário, principalmente por conta da simpatia, atendimento atencioso e do desprendimento de seu dono, Preston.

Do outro lado da cidade, em um antigo templo vivia Alinthas, o clérigo do Deus do Conhecimento, que ali se encontrava justamente por uma estranha escolha ao pedir ao clero de sua igreja para que fosse removido para aquela cidade. Mesmo aparentemente não concordando, seus superiores cederam ao seu desejo em pagamento aos seus imensos préstimos ao seu deus e sua fé. Mas as intenções deles estavam além do atendimento de um capricho de um clérigo novato. Eles pretendiam ter alguém suficientemente fiel ajudando a cuidar da velha biblioteca, e porque seria um tanto quanto irônico enviar para uma cidade cheia de conflitos entre humanos e anões, justamente um elfo, e eles gostariam de ver o resultado deste acontecimento inusitado para levantar dados, classificar e catalogar tais desdobramentos. E enquanto lembra-se desse fato, Alinthas mantinha sua expressão taciturna enquanto observa a cidade da sacada de seu quarto no templo, tentando entender o objeto que repousa em suas mãos. A ele havia sido entregue um estranho livro, com sua capa feita de folhas compridas e pontiagudas de alguma árvore desconhecida, unidas em uma densa trama. Nesta peculiar capa, estava escrito na língua mágica e estranha dos dragões: “Sad ex narshex liaxusbia bolemfia flusmfe ia xiafia kuskrax a kamshiakusjiamfa be quusbe bax Lgaxerfl iamfliathoia ea jekoreba phiare rithlusje be quusbe xajiamfia phele ma natha phialiakial” - que quer dizer: “Sob as folhas reside durante trinta e sete ciclos o conhecimento da vida dos Ljosaltr entregue ao maculado pela lágrima da vida somente para no fogo perecer”. O elfo estranhava o fato de um livro tão pretensioso ter tão poucas páginas - não mais que vinte -, e ser impedido de ver seu conteúdo, não por ter cadeado, feitiço aparente ou qualquer outra forma visível ou detectável que impeça qualquer um o ler, o livro simplesmente não se abria. Talvez a mensagem da capa fosse um enigma. Afinal, o sentido dos trinta e sete ciclos se tornara óbvio. Mas qual era o conhecimento dos Ljosaltr? O que significava "maculado pela lágrima da vida”? E a última parte, era uma sentença, uma predestinação ou parte do enigma? Sem respostas, Alinthas não escondia seu desconforto e o peso daquele fardo, pois sua preocupação se voltava para o prazo e a ordem dada pelo homem que lhe entregou aquele livro. Ele deveria se dirigir para aquela distante e próspera cidade, além de conseguir ler as palavras contidas naquele livro em trinta e sete dias. Sem respostas ou qualquer pista do que se tratava. Apenas sabia que tinha trinta e sete dias. E este prazo terminava naquela noite.

Absorto em seus pensamentos, Nathan, teve sua atenção subitamente desviada por um estranho visitante que acabara de adentrar o ambiente. Parecendo que havia trazido uma tempestade em suas costas, como um arauto dos deuses, a imensa figura com os seus longos cabelos negros grudados em sua face e sobre seus ombros cobertos com pele animal, pingava sobre o assoalho parecendo trazer intencionalmente parte daquela chuva inesperada para compartilhar com os foliões que não haviam percebido a mudança climática repentina, enquanto o vento invadia a porta do ambiente, espalhando os sons e o cheiro de chão molhado pelo recinto. Acostumados com forasteiros, os poucos que perceberam sua entrada logo voltaram para sua dança ou bebedeira assim que ele sentou em uma mesa próxima à porta. Porém, Nathan, manteve seus olhos sobre o estranho. Sendo servido rapidamente por uma graciosa garçonete armada com uma bandeja cheia de canecas vazias e cheias para agilizar o serviço naquela ocasião; mas logo ela se afastou, após ter recebido uma resposta aparentemente ríspida. Com sua bebida em mãos, seguia batendo-a impacientemente na mesa, até o momento em que explodiu em um grito, fazendo com que todos parassem e se calassem imediatamente.

- Pare com este barulho!

Começou imediatamente um burburinho quando o estranho se fez perceber. Um dos clientes da taverna, um rapaz que trazia o brilho característico da juventude e sua imaturidade, recoberto com uma pesada armadura e um arsenal incomum para sua média estatura, levantou-se e gritou desafiando-o, em favor do bardo que já tentava apaziguar os ânimos em vão.

- Seu bastardo, filho de uma meia-orc! Quem pensa que é para estragar a festa dos outros?

Certo de que intimidaria o estranho assim como sempre fazia com outros arruaceiros, o jovem rapaz não pôde conter o suor que começava a brotar em sua testa quando esteve frente a frente com seu adversário que já se encontrava em pé ao lado da mesa, levantando seus olhos que estavam à altura do largo e forte peito arrepiado pelo frio, para poder encará-lo, vendo-o apenas abaixar seus olhos emoldurados por uma máscara impassível. O vento parecia sibilar aos dois que se enfrentavam através do olhar, invadindo o ambiente e apagando todas as velas do salão e deixando as luzes das casas e estabelecimentos próximos adentrarem no ambiente pelas frestas das paredes de madeira desgastadas pelo tempo. A invasão de luz pintava aquele homem gigantesco, dando uma aparência ainda mais intimidadora. Sua pele ricamente adornada por tatuagens e pinturas tribais, inúmeras cicatrizes de batalhas e caçadas que apareciam rapidamente naquela luz efêmera eram o motivo de tão grande mudança em sua aparência. Aqueles momentos de tenso silêncio pareciam ser eternos, quebrados apenas pelos olhares elétricos dos dois confrontantes e pela voz do bardo, que tentava dispersar as pessoas e continuar sua apresentação, sentando-se novamente em seu banco e parecendo querer encontrar notas mais agradáveis aos ouvidos do desconhecido. A tensão foi somente quebrada pelo som de lâminas saindo de suas bainhas, sob protestos e incentivos de algum dos companheiros do jovem cavaleiro. Enquanto olhos faiscavam, pessoas corriam de medo e horror procurando abrigos dentro da própria taverna, inundados por lembranças de embates e sangue rolando sem sentido nestas já esquecidas batalhas pelo orgulho e pelo ego. Quando as lâminas se cruzaram e retiniram ao som dos gritos de bravata de combatentes, elas foram seguradas por uma delicada mão acompanha de uma firme, mas aveludada voz.

– Timal dül ojjü! Parem com isso!

A voz saia de uma longa capa com um capuz que logo foi jogado para trás, mostrando os olhos amendoados dos elfos. Surpresos pela intromissão, logo perceberam que a esguia figura estava acompanhada por outra figura encapuzada, que também se revelou uma elfa. Mas, esta era diferente. Com traços mais arredondados e uma orelha menos proeminente, lembrava de certa forma, uma humana, muito bela por sinal. Esta agora, repousava sua mão sobre o ombro do gigante guerreiro.

- Parem com isso, já! Não se resolve os problemas desta forma e nem agora. Ij tajjüij dülalümil i dolii a düdoj i lümga? As pessoas comemoram a vida, e vocês querem morte? Honrado guerreiro, olhe seu inimigo e sua juventude! Sua imaturidade é facilmente perdoada por conta da impulsividade natural desta idade. Você mesmo já foi imprudente, não? E você, meu jovem, se acha experiente o bastante para enfrentar tal espada? Perceba as cicatrizes e a calma nos olhos deste homem, que já viram tantas mortes quanto há seres viventes nestas terras. Sejamos sensatos e vamos nos sentar juntos e comemorar este dia como velhos companheiros.

Sem entenderem o que se passava, abaixaram as armas instintivamente, como se estivessem cometendo algum sacrilégio ao mantê-las erguidas. Todavia, o que realmente fizera o experiente guerreiro abaixar a arma foi justamente a mão da pequena e esguia mulher de orelhas proeminentes, que sem causa aparente, fizeram seus músculos relaxarem ao ser preso por aqueles olhos e o rosto que balançava negativamente, transmitindo serenidade aos seus pensamentos. Mesmo sentindo estar errado por evadir-se de um combate pela honra, não pudera deixar de sentir a calma transmitida por aqueles olhos. Sem trocarem uma palavra sequer, ambos sentiam-se cansados como se tivessem tido um embate intelectual inaudível aos outros.

- Danü ilopü! Ae qüi ajgidi tamliarliü ij ajtamirlij! Eu já estava perdendo as esperanças! – disse Nathan, indo de encontro a eles, enquanto desviava-se do círculo humano que se formara em torno do embate.

- Sim, meu irmão! Aqui estamos!

O elfo e o clérigo cumprimentaram-se, segurando o antebraço um do outro, seguido de um longo e apertado abraço de companheiros que não se viam por um longo período de tempo.

- Danü ilopü, vejo que não perdeu o costume de tentar mudar o mundo!

- E vejo que não se cansa de se abster em nome do livre arbítrio, não é mesmo, dneimopü Nathan?

E os dois riram, enquanto o jovem cavaleiro afastava-se, frustrado. Seu companheiro de viagens tentava convencê-lo a voltar a combater, mas o desafiante sentia-se aliviado por não ter entrado em combate. Apesar de sentir-se capaz, desta vez seu orgulho foi superado pelo sentimento de auto-preservação.

- Sente-se conosco, guerreiro. Vamos apreciar uma bela caneca de vinho, que vou lhe explicar tudo.

O elfo dirigiu-se à afastada mesa onde Nathan estivera durante toda a noite e sentou-se, enquanto os outros o seguiam em silêncio e as pessoas se afastavam. Algumas chateadas com o fim do combate que talvez trouxesse um pouco de diversão àquela noite, enquanto outros agradeciam por aquilo não ter se prolongado e vitimizado mais pessoas que aquelas que realmente se confrontavam. De certa forma, todos ali sabiam que brigas em tavernas acabavam adquirindo proporções maiores do que se imaginava inicialmente, fazendo até mesmo todos esquecerem o decoro ou quem havia começado a confusão e aproveitando-se da situação para agredir algum desafeto. O próprio bardo agora estava sorridente, enquanto tocava mais uma de suas músicas, mas seu receio deixava mais baixa sua voz, e cautelosamente procurando um meio de não irritar mais ninguém.

Com todos já acomodados à mesa, o forasteiro não conseguia tirar seus olhos da face daquela que lhe passou tanta paz, somente com o olhar. Acabou por deixá-la constrangida com aquela situação que não estava acostumada.

- Sal, dilüj ne rüjji lojjieü. Qual é seu nome, nobre guerreiro? – perguntou-lhe o elfo, tirando-lhe do transe e aliviando sua companheira daquela situação constrangedora.

- Aorn, senhor! – ele respondeu, ficando em pé – Aorn, filho de Beorgar, da casa de Beor! Sou do norte, senhor.

Apesar de toda a etiqueta, Nathan percebeu o escarninho no olhar do guerreiro em direção ao elfo.

- O meu é Nathan, este é Eglair e esta é Sahadrian. Não ligue para Eglair! Ele acredita que as pessoas podem se entender somente através do diálogo. Enquanto nossa amiga, simplesmente não fala...

- Por quê? É muda? – o descendente de Beorgar perguntou em tom de chacota.

- Sim... – respondeu-lhe Eglair, que sentiu pena ao ver o guerreiro ficar desconcertado com as próprias palavras.

- Dneimopü Eglair! Vamos ao que interessa, pois nosso tempo é curto...

- Sim, dneimopü Nathan. Eu compreendo a gravidade da situação e vim o mais rápido que pude. Eu e Sahadrian tivemos contratempos, mas conseguimos chegar ainda neste dia. Espero que não seja tarde demais... Levantou todos os dados necessários, velho amigo?

- Obviamente! – respondeu prontamente – Mas, devemos pensar muito bem o que devemos fazer...

- Esperem! – falou Aorn, em um dialeto do Comum, utilizado por mercenários, mas carregado de seu sotaque nortista – Se estão tratando de negócios, por que me chamaram para esta conversa? E parem de falar esta maldita língua, pois não os entendo. Se acaso me chamaram para fazer parte do negócio, saibam desde já que meu tempo passa em paga de moedas de ouro. Não pensem que não cobrarei...

- Sei que sim, Aorn. – disse-lhe Eglair – Entretanto, devo-lhe fazer uma pergunta. Como veio parar aqui nesta cidade? Veio para trabalhar de mercenário ou está somente de passagem?

- Eglair! Dilüj gmigim lia rüjji lojjieü jüxorüj. Não precisamos discutir este assunto com ele. Podemos dispensá-lo. – disse Nathan, que logo se sentiu intimidado pelo olhar ferino e inquisidor de Aorn, enquanto passava pela sua cabeça qual seria o tamanho do espírito de luta deste homem capaz de abalá-lo. – Não precisamos dele. Temos eu, você e a Sahadrian. Para a nossa missão será suficiente.

- Não, Nathan! Não! Estamos nessa juntos. Nossos caminhos não se cruzaram em vão, afinal, a presença de nosso mais novo amigo já havia sido prevista pelo Oráculo...

- O que? O Oráculo lhe disse que encontraríamos este homem? Não vejo a razão pela qual ele deve juntar-se a nós em nossa missão, ainda mais pelo fato de que não haverá grandes ganhos para um mercenário...

A resposta de Aorn foi bem típica dele, um rosnar entre os dentes, seguido de eu olhar penetrante em direção a Nathan que novamente se intimida pela ferocidade de seu companheiro de mesa. Não por covardia, dada a experiência em batalha e a capacidade estratégica que lhe dera a confiança dos guerreiros de campanha. Mas o seu instinto de autopreservação e capacidade de analisar seus adversários traziam um sentimento de respeito pelo companheiro imposto, que exalava por seus poros o cheiro de campos de batalha, de fuligem. A sensação de estar diante de um predador, que atacava somente quando sentia-se acuado, mas com a ferocidade capaz de espantar a maior parte dos adversários somente com o olhar.

- Logo entenderá, Nathan. Aorn, eu sei que posso perguntar, pois estou diante de um guerreiro honrado, que mesmo tendo caminhado com mercenários sabe o valor da honra, então responda-nos: Como veio parar nesta cidade? Está vagando ou veio em busca de trabalho?

Aorn então voltou seus olhos para a mulher novamente, depois olhando detidamente o rosto de seus interpeladores balançando a cabeça negativamente, expirando forte e deixando claro sua impaciência.

- Como eu lhes disse, vim do Norte. O Norte Longínquo. Minha tribo foi dizimada pelos homens do oeste.

- Sub-homens? Com aparência simiesca, não é?

- Sim. Eram muitos e os caçadores e guerreiros estavam fora da aldeia. Era dia da caçada dos jovens. Eles foram todos deixados na borda da floresta para caçarem seus lobos, e nós, os mais velhos, aguardávamos o regresso. Eu observava o horizonte, vendo os acertos e os erros de cada um, quando senti o cheiro de fuligem e de carne queimando. Meu instinto me fez voltar para a planície em minhas costas. O que eu vi – Aorn interrompeu sua narrativa, demonstrando em seu rosto toda a apreensão e consternação que as lembranças daquele momento lhe causavam -, foi horrível. Ao longe, no lugar onde estaria nossa aldeia só existia uma longa coluna de fumaça. Gritei por todos os guerreiros que estavam à minha volta, e os outros nos seguiram ao nos ver correndo em direção à aldeia. Foi nosso erro. Mesmo correndo, demoramos muito e a cena que nos deparamos me traz pesadelos até hoje. Crianças, mulheres e os anciãos estavam todos estirados no chão, decapitados ou sem os escalpos. Nossas tendas ardiam em fogo. Apesar da maior parte dos nossos inimigos já terem deixado nossa aldeia para trás, ainda havia centenas deles. Milhares! Não somos covardes!

Todos na mesa sentiram-se tocados pela tristeza de Aorn, que parecia ter sido transportado para aquela cena que marcara seu coração como uma cicatriz purulenta, marejando seus olhos e fazendo-o olhar para algum lugar distante e perdido no tempo. Seus ombros tensos não demonstravam tanto sua revolta e sua impotência quanto seus punhos cerrados, em que as juntas esbranquiçadas mostravam o tamanho de sua frustração.

- Corremos brandindo nossas espadas e machados, fazendo rolar a cabeça de nossos inimigos, mas eles eram muitos! Eles se fechavam sobre cada um de nós, e arrancavam pedaços que voavam em nossa direção! Logo estávamos todos cobertos com sangue de nossos inimigos, nosso e de nossos companheiros! Fomos caindo um a um, apesar da fúria em nosso ataque.

- E como você sobreviveu? – perguntou Nathan, escolhendo cada palavra para não ferir ainda mais o gigante que agora chorava, com o rosto em suas mãos, ou pior ainda, despertando sua fúria por fazer pouco de sua dolorosa lembrança. Como que desperto de um transe, Aorn recuperou a compostura, enquanto enxugava as lágrimas com as costas das mãos. Sahadrian abaixou o rosto, quando percebeu que não conseguiria esconder o sorriso ao observar o rosto do gigante se transformando novamente.

- Eu nunca soube o que realmente aconteceu, o porquê de estar vivo. Apenas acordei, dias depois, em meio aos corpos de meus companheiros em um monte feito por nossos inimigos. Eu fui tomado pelo horror ao ter que escavar todos aqueles corpos de amigos, companheiros, irmãos... Todos os rostos conhecidos tomados pela rigidez da morte. Aves comiam partes deles! Eu achei que tinha morrido e ido ao inferno! Corri desesperadamente, por dias. Comi plantas e bebi água de poças, só para voltar a correr. Queria fugir daquele inferno. Entrei em uma floresta a oeste daqui, onde fui encontrado dias depois por alguns mercenários, quase morto. Os dias que passei ali foram horríveis. Não tinham frutos ou plantas comestíveis, somente árvores a perder de vista. Eu cheguei a caçar com uma lança improvisada, mas a visão das minhas presas fazia rememorar cada momento. Os mercenários cuidaram de mim e me ensinaram sua língua, pensando que eu era um fugitivo. Eu estava fraco demais para esboçar qualquer reação, mas logo ia me recuperando. Eu os acompanhei por seus caminhos, ajudei-os da maneira que pude para pagar o que haviam feito por mim. Fiz coisas que desonraria meu pai. Mas, meus companheiros se foram...

- Tem um detalhe que não nos disse, Aorn. – interrompeu Eglair.

- E qual seria, Aorn? – perguntou Nathan, observando a expressão de surpresa de Aorn.

- Eu não sei o que quer dizer...

O elfo apenas demonstrou que Aorn sabia do que estava falando através da expressão de indignação em seu rosto. O gigante coçou a cabeça sem-graça, balançando a cabeça negativamente e bufando. Sentiu um toque seu ombro, virando o rosto para saber de que se tratava. Encontrou o rosto de Sahadrian com um largo sorriso, que apenas meneou com a cabeça. O guerreiro entendeu e apertando os lábios respondeu positivamente, e estendeu sua resposta retirando parte do couro que cobria seu torso forte. Em seu peito havia uma marca que fez o elfo rir da expressão de espanto de Nathan.

- Mas isso é... É... – Nathan disse apontando e se aproximando de Aorn, que arredio e surpreso dava passos para trás. – É a Manopla!

- Sim, Nathan. É o signo de sua religião e também o totem da tribo de Aorn. Mas vamos. Nosso tempo é curto e ainda há um companheiro a juntar-se a nós. Ele nos aguarda lá fora.

- Mas... Mas, a Manopla! Eu não entendo... Espere. Quem nos aguarda? E por que não entrou aqui?

- É um velho conhecido, Nathan. Logo o verá e se sentirá mais aliviado dele estar ao nosso lado. Sahadrian acompanhe Aorn e saiam juntos. Ele estará seguro ao ver que está conosco. Enquanto isso, eu e Nathan pagaremos nossas bebidas e sairemos em seguida.

Aorn, sem entender o que estava acontecendo, apenas acompanhou a bela jovem até a saída da taverna. Ele não pode deixar de notar, enquanto caminhava atrás dela, o requebrar sensual de seus quadris. Pensamentos libidinosos logo invadiram sua mente, mas que logo foram afastados pela parada de sua guia. Assim que sentiu a presença dos outros dois companheiros, ele a viu apontar para cima, em direção aos telhados das casas à sua frente. Ouviu a expressão “Ah, não!” sair da boca de Nathan, enquanto apertava os olhos tentando enxergar o que a pequena meia-elfa apontava. A noite escura e chuvosa dificultava sua visão treinada, mas ele conseguia distinguir apenas um pequeno vulto sobre os telhados. Um raio acendeu a noite repentinamente, e ele pode ter um pequeno vislumbre do homem com capuz agachado sobre o telhado.

- Ah, não! Ele não! – Nathan esbravejou – Por que você o chamou, Eglair? Justo ele? Primeiro oferece ganhos para um mercenário, e agora quer me aliar com um assassino?

- Yára sermo, não devemos julgar as pessoas pelos seus atos. Pelo menos, não exclusivamente. Ele nos serviu, e serviu aos nossos no passado. E a conseqüência de seus atos é o que contou.

- Não posso concordar com isto. Você sabe muito bem o que aconteceu da última vez em que ele se juntou a nós. A vida dele se resume a sangue e aço, Eglair. Não posso permitir que ele se junte a nós.

Parecendo uma resposta, como estivesse ouvindo, os olhos do homem sobre o telhado cintilaram em um tom lavanda sob a luz de um novo raio.

- Bem, apenas vou dizer-lhe que nossa companhia se faz necessária. Tanto que quem lhe enviou foram nossos superiores, que decidiram isto depois de consultarem o oráculo. Mas vamos, perdemos muito tempo...

Autor: Fernando "Fera" Carvalho

Tema: Clérigo, Elfo, dedicado ao seu Deus.

Desafiante: Neto